segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

O Oleiro e o barro


“Desci à casa do oleiro, e eis que estava à sua obra sobre as rodas”. Jeremias observou o oleiro em sua labuta. O oleiro estava na roda, trabalhando em uma massa de barro ainda disforme. Ele girava o torno e seus habilidosos dedos davam forma ao barro. Uma leve pressão aqui, outra intensa ali, e um vaso começava a surgir do barro disforme.
Você tem idéia da importância da cerâmica? A invenção do trabalho em barro deu início a uma verdadeira revolução. Antes do surgimento dessa atividade havia somente tribos nômades, conduzindo rebanhos de animais, deslocando-se de um lado para outro, movidas pela falta de água e alimento. Não havia tempo para desenvolver coisa alguma, nem descanso para dedicar-se à reflexão. Era uma cultura de subsistência, de busca diária de sobrevivência. Porém, a invenção da cerâmica tornou possível armazenar e transportar víveres. Agora era possível permanecer mais tempo num lugar, pois havia como guardar a água e os grãos para o inverno seguinte. Era possível cozinhar e transportar mercadorias. A cerâmica assinalou uma revolução que resultou no que chamamos de civilização – a Era Neolítica.
Tente imaginar como a vida seria diferente se não houvesse recipientes nos quais pudéssemos armazenar as coisas: nada de potes e panelas, tigelas e pratos, baldes e jarras, canecas e barris, nada de caixas de papelão e envelopes de papel pardo, nada de sacos de grãos e tanques para armazenar líquidos. A administração dos mantimentos seria reduzida ao que se usa num único dia, ao que se pode levar nas mãos. O advento da cerâmica possibilitou o desenvolvimento das comunidades. A vida estendeu-se para além do imediato.
O impacto da invenção da cerâmica foi imenso. Porém, existiu algo mais nisso tudo que foi igualmente importante. Ninguém jamais foi capaz de fazer um pote de barro que fosse apenas um pote de barro.
Cada um deles é uma pequena obra de arte. Os oleiros estão sempre inovando, criando novos contornos, tamanhos e processos de modelação para dar forma e acabamento finais que resultem numa combinação agradável de curvas. Não existe uma peça de cerâmica que, além de ser útil, não seja ao mesmo tempo bela. Ela é modelada, desenhada, lavada ao forno e pintada. É um dos utensílios mais funcionais que existem, e também um dos mais bonitos.
Na época em que Jeremias viveu, ninguém colocava uma peça de cerâmica na prateleira apenas para admirá-la, usando-a somente como item decorativo, a fim de dar um toque de estética ao ambiente. Porém, o contrário também era verdade. Ninguém usava a peça de cerâmica apenas por causa de sua utilidade – sempre havia no objeto os sinais das mãos de um artista.
É difícil compreendermos perfeitamente a importância dessa associação, pois vivemos num mundo diferente. Geralmente, fazemos distinção entre o que é útil e o que é belo, entre o necessário e o decorativo. Usamos sacos de papel pardo para guardar mantimentos, sem nenhuma preocupação estética. Afinal, tudo o que queremos é algo para guardar os produtos de casa. Se quisermos embelezar as paredes de nossos lares compramos quadros. Construímos prédios de escritórios sem nenhuma originalidade e feias fábricas.
Penas visando à funcionalidade dos trabalhos que serão desempenhados. Em contrapartida, construímos lindos museus para abrigar objetos de arte. Houve, porém, períodos na história em que as coisas eram melhores, quando o necessário e o belo estavam interligados, quando, na verdade, era inimaginável separar essas duas características. Com certeza era assim para Jeremias: não havia sacos de papel e museus, mas havia a cerâmica. Por toda parte. Útil e bela. Funcionalmente necessária e artisticamente bonita. Duas características presentes numa mesma peça que, de forma nenhuma, podiam ser vistas em separado.
A imaginação criadora de Jeremias começou a trabalhar quando ele viu aquele oleiro moldando o barro disforme na roda. É provável que Jeremias já tivesse visto muitos oleiros trabalhando antes, mas, naquela ocasião, ele viu algo mais – ele vislumbrou Deus modelando um povo para sua glória. Um povo de Deus. Homens e mulheres criados à imagem divina. Necessários, mas não só isso – belos também. Formosos mas não apenas isso – úteis também. Cada ser humano é um misto de necessidade e liberdade. Não há pessoa que não seja útil, que não tenha seu papel dentro do que Deus está realizando. E não há ninguém que não seja único, dotado de linhas, cores e formas totalmente distintas das que há em qualquer outro. Todas essas verdades tornaram-se cristalinas na mente de Jeremias na casa do oleiro: o aspecto bruto do barro, úmido e sem vida, ia sendo modelado para um propósito específico pelas mãos habilidosas do oleiro e, enquanto o barro ia adquirindo forma, o profeta compreendeu a singular individualidade e a ampla utilidade que aquele barro teria quando todo o processo, da modelagem ao acabamento final, passando pela pintura e pelo cozimento, fosse concluído. Deus nos molda de acordo com Seus eternos propósitos e inicia esse processo aqui mesmo. O pó de onde viemos e a imagem de Deus à qual fomos feitos são um e os mesmos.

Eugene H. Peterson. Ânimo. Ed. Mundo cristão.

Um comentário:

Miguel Junior disse...

Quando alguns cientistas, de posse das fantástics fotos do espaço-telescópio HUBLE, muito se admiram e vêem a beleza e a complexidade das composições intergaláticas, logo proporcionam aos espiritualistas nossa real dimensão matgerial, isto é, como a maior estrela é infinitamente maior que nosso sol...esquecem-se de como infinitamente menor são os sub-átomos, ou matérias componentes do átomo...
DEUS é atemporal e é supra-espcaciai. Nada O contém...tudo é a Criação, exceto Ele, o Criador...
O Homem pensa, às vezes, o quanto são duros os corações, esquecido que o seu é tão, ou mais duro que o diamante, como o da maioria...
Mas há um Oleiro que trabalha neles... o mais fácil, ou difícil, é admitir a ação do Médico sobre suas feridas que tanto dóem, pois devemos querer ser curados...
Ele nos deu esse Direito, isto é, o de admitirmos que precisamos ser tratados, conformados segundo Sua vontade... Todos os dias Suas Misericórdias, sua atenção ás nossas misérias, se renovam...Sua proposta de nos quebrar e nos refazer estão diante de nós, auto-justificados e praticantes de obras que sempre pensamos que possam retardar o tratamento adequado, o refazer nossos corações, o remoldar não só nossas caras de pesar, nossos bicos de insatisfações, nossos bater-de-pés, que nos impedem andar a segunda milha, o nos regozijar porque temos passado, vivos, as tribulações desse mundo tenebroso, de sermos gratos a ponto de orarmos pelo adverário, pelo inimigo com quem dormimos...a quem devemos oferecer a outra face 490 vezes ao dia, por amor a Cristo que perdoa o que fazemos e o que somos ainda...
Deus tem uma Aliança conosco (foi alto o Preço) e devemos honrá-lA amando, simplesmente amando a justos e injustos, a maus e bons:
entreguemo-nos, rendamo-nos às Suas Mãos de Oleiro !
fraternamente,
Miguel Junior. e