segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

A paternidade de Deus


Roberta Bondi, catedrática de história da igreja, conta um episódio muito pessoal de como a compaixão de Jesus pelos oprimidos destruiu a resistência dela em relação a Deus e ajudou a corrigir uma imagem distorcida. Ela lutou por muito tempo contra a expressão “Deus Pai”, principalmente porque seu pai na terra era para ela um figura austera e distante. Não tolerava erros ou fraquezas, desobediência dos filhos ou da esposa, questionamentos ou dúvidas. Tinha uma idéia clara do lugar da mulher: doce e flexível, calma e submissa.


Por mais que se esforçasse, Roberta nunca conseguiu ser flexível ou calma e passou a infância carregando o pesado fardo de ter decepcionado o pai. Ele abandonou a família antes que Roberta completasse doze anos, e, depois disso, encontravam-se apenas uma vez por ano. A ira alastrou-se como uma infecção dentro dela, e sempre que ela ouvia alguém dizer “Deus Pai”, a raiva vinha à tona.

A carreira acadêmica de Bondi levou-a a Oxford, onde ironicamente estudou os “pais da igreja”. Nas obras dos monges cristãos do deserto do Egito, encontrou uma imagem diferente do Pai celestial: um Deus gentil, que ama especialmente aqueles a quem o mundo despreza e compreende os fracos, as tentações e os sofrimentos. Ela tentou usar a palavra “Pai” na oração com limitado sucesso, até que um dia deparou com a última conversa entre Jesus e os apóstolos antes de Ele ser preso e morto.

Nessa cena, quando Jesus fala em voltar para o Pai, os discípulos ficam olhando para Ele, admirados, sem nada compreender, até que por fim Felipe explode: “Senhor, mostra-nos o Pai, e isso nos basta”. Jesus responde: “Você não Me conhece, Felipe, mesmo depois de Eu ter estado com vocês durante tanto tempo? Quem Me vê, vê o Pai. Como você pode dizer: ‘Mostra-me o Pai’?”.


“Quem Me vê, vê o Pai!” Bondi, historiadora e teóloga da igreja, espantou-se diante desse admirável conceito novo. Se Jesus demonstra preocupação especial pelos pobres, pelas viúvas e pelos socialmente rejeitados, então o Pai também. Bondi projetara erradamente em Deus sua idéia distorcida a respeito da paternidade; mas, como descobriu depois, o ideal de Deus oferecia um forte castigo para os pais humanos que falham. Com a ajuda de Jesus, o Deus visível, ela viu Deus com novos olhos.


Quando Bondi leu os evangelhos com a mente aberta, cada história assumiu um colorido totalmente novo. Por exemplo, a história de Lázaro, em João 11, ela notou a interação de Jesus com as duas irmãs. O mesmo Jesus que pôde acessar o Poder do Pai para ressuscitar Lázaro dos mortos também Se encheu de comiseração e chorou junto com as amigas Maria e Marta. Além disso, permitiu que as duas irmãs O repreendessem por ter chegado tarde. Ainda ressentida com a própria infância, Bondi observou, além de tudo, que as irmãs não pareciam nada intimidadas por Jesus. Não aceitaram passivamente o que tinha acontecido como se fosse vontade de Deus e abriram o coração, demonstrando a Jesus a revolta que sentiam.


Aos poucos, Bondi teve uma idéia de como o relacionamento com Deus deveria ser.
“Antes eu achava que a intenção de Jesus quando nos mandava chamar Deus de “Pai” era fazer com que os filhos de Deus se relacionassem com o Pai como crianças pequenas diante de um pai benevolente e autoritário, que prefere bebês a adolescentes, porque os primeiros são mansos, e os outros, complicados. (...) Não suportaria me relacionar com um Deus que exigisse que eu vivesse como uma criança desamparada”.


Para sua satisfação, ela descobriu que Deus prefere ter um relacionamento com adultos amadurecidos, como Jesus teve com Seus discípulos.


“Já não os chamo servos. (...) Em vez disso, Eu os tenho chamado amigos”, Jesus anunciou aos discípulos com uma evidente sensação de alívio, saboreando as vantagens da Encarnação.
O mundo não consegue superar o enorme abismo entre o que espera de Deus e o que e o que Deus lhe ofereceu em Jesus. Outras religiões respeitam Jesus como mestre sábio e líder admirável, mas não como Deus. Os adeptos da Nova Era procuram algo mais místico, mais satisfatório pessoalmente. A melhor Expressão da Essência de Deus desperta tanta rejeição em nosso tempo quanto despertou no d’Ele.


Yancey, o Deus (in)visível, ed. Vida.

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